Desde que a pandemia de Covid-19 foi declarada pela OMS, em 11 de março de 2019, muita coisa mudou. No mundo inteiro, já foram registrados mais de 200 milhões de casos da doença, além de sérios impactos sanitários, sociais, políticos e econômicos. Mas a conclusão sobre a origem do vírus SARS-CoV-2 continua sendo alvo de teorias da conspiração.
Após a publicação de um relatório que descarta a hipótese de vazamento em laboratório, a Organização Mundial da Saúde voltou atrás. Segundo o órgão, essa hipótese e outras três continuam em análise, incluindo a de transmissão para humanos por meio de um animal.
Agora, cientistas alertam para atrasos que tornam a investigação mais difícil, sob o risco de tornarem alguns estudos “biologicamente impossíveis”. Ainda não se sabe quando, onde ou como surgiu o vírus causador da doença.
Corrida contra o tempo
Em novembro de 2020, a OMS convocou um grupo internacional de especialistas para realizar um estudo inicial sobre as origens do SARS-CoV-2. Em janeiro de 2021, o grupo passou 28 dias em missão na cidade chinesa de Wuhan, onde foi registrado o primeiro surto de Covid-19.
Após visitas técnicas, entrevistas e coleta de dados, as informações foram analisadas e discutidas. Em março deste ano, os resultados da missão foram publicados em um relatório de 120 páginas, com contribuição de pesquisadores e autoridades chineses.
Esse documento foi recebido com críticas por pesquisadores e representantes internacionais, que apontaram limitações nas amostras citadas e a falta de acesso a dados brutos. Cientistas das principais universidades do mundo afirmaram, em carta, que a teoria de vazamento do vírus em laboratório não foi abordada com o mesmo equilíbrio da teoria de origem natural.
Um novo relatório foi publicado no fim de agosto deste ano, dessa vez elaborado pelo serviço de inteligência dos EUA, à mando do governo. O resultado também foi inconclusivo sobre como o SARS-CoV-2 chegou aos seres humanos.
Na mesma semana, o grupo convocado pela OMS para o estudo inicial publicou um artigo detalhando o processo de investigação, culpando o governo chinês por dificultar o acesso a informações importantes e cobrando a aceleração das investigações sobre a origem do vírus.

Teorias sobre a origem do SARS-CoV-2
O estudo da OMS – até então o mais completo já publicado – trabalha com quatro hipóteses sobre a origem do vírus causador da Covid-19. A teoria de vazamento em laboratório, inicialmente descartada, voltou a ser investigada após a publicação do relatório e o surgimento de novas informações, mas nada ainda é certo.
Vale frisar que, de todas as hipóteses sobre como o vírus SARS-CoV-2 surgiu e infectou humanos, nenhuma delas foi confirmada até o momento/ainda, por falta de dados e provas suficientes. Por isso, por enquanto não é possível especular possíveis conclusões, podemos apenas acompanhar as linhas de investigação.
1- Transmissão zoonótica direta

A OMS classifica como “possível a provável” a teoria que atribui a contaminação humana pelo vírus SARS-CoV-2, em sua configuração atual, vinda de um animal. Ela também é conhecida como transbordamento direto.
É muito comum ver essa hipótese atrelada ao morcego, especialmente à espécie Rhinolophus affinis, cujas análises detectaram, em 2013, quatro tipos de coronavírus até então inéditos. Um deles, chamado RaTG13, até hoje é o mais parecido com o Sars-CoV-2, compartilhando 96,2% do mesmo material genético.
Apesar disso, essa é uma porcentagem baixa. A título de comparação, os seres humanos compartilham 98,7% de material genético com os bonobos, um tipo de chimpanzé.
2- Transmissão zoonótica indireta

De acordo com a OMS, é “provável a muito provável” que o vírus da Covid-19 tenha chegado aos humanos por um animal intermediário. Ou seja, uma espécie contaminada por um morcego, por exemplo, e que virou hospedeira. Nela, o vírus teria sofrido mutações para chegar à forma atual do SARS-CoV-2.
A diferença é que, em outros casos da família coronavírus, como na síndrome respiratória aguda grave (SARS) e na síndrome respiratória do Oriente Médio (MERS), os hospedeiros foram identificados em poucos meses (civeta e dromedário, respectivamente).
3- Transmissão zoonótica alimentar

Essa é a hipótese mais defendida pelo governo da China, e a OMS afirma ser “possível”. Nela, o vírus teria sido importado de outro país por meio de alimentos congelados, como frios e embalagens de bacalhau. Outras afirmações do governo chinês acusam o vírus de ter sido desenvolvido em laboratórios militares de outros países.
Nenhuma das teorias de contaminação alimentar, porém, justificam o fato de o primeiro surto ter sido em Wuhan, na China, e não no local de origem desses alimentos ou embalagens.
4- Transmissão por vazamento em laboratório

A hipótese mais polêmica de origem do vírus da Covid-19, e uma das mais citadas por pesquisadores, está descrita como “extremamente improvável” pelo relatório da OMS.
De fato, há registros que confirmam que o Instituto de Virologia em Wuhan, com nível máximo de biossegurança, fazia pesquisas com coronavírus como parte de um acordo de cooperação científica entre a China e os EUA. E um desses coronavírus citados era o RaTG13, até então o mais próximo do SARS-CoV-2.
Mas nenhuma prova de vazamento foi encontrada. Além disso, é pouco provável que se prove a hipótese de arma biológica ou alguma tentativa de vantagem por parte da China no vazamento do vírus, já que o próprio país foi um dos mais prejudicados pela pandemia de Covid-19.
A importância da conclusão
De acordo com cientistas, descobrir a origem do SARS-CoV-2 é uma prioridade global. Isso porque, a partir dessa conclusão, será possível tomar medidas globais de prevenção de novos casos e também de novos surtos.
Se for provado que o vírus veio de um animal, autoridades políticas e sanitárias poderão tomar medidas adequadas como a redução do contato e da demanda, além da proteção do habitat natural.
Mas se a conclusão dos estudos apontar o vazamento do vírus de um laboratório, medidas serão tomadas para aumentar a segurança de estudos envolvendo vírus que podem contaminar humanos, mas sanções internacionais certamente serão discutidas.
Questões como essa são complexas. O conhecimento científico é uma construção que depende de vários estudos e pesquisas, que podem levar algum tempo.
Agora que você já sabe as principais teorias de pesquisa sobre a origem do SARS-CoV-2, que tal ver como a ciência usa a genética para buscar novos tratamentos contra a Covid-19?