Por que algumas doenças genéticas são mais comuns em certas populações?

Doencas geneticas e grupos populacionais
Entenda como a genética explica por que algumas doenças são mais comuns em certas populações. Veja também exemplos desses casos.

Quando estudamos a frequência de certas doenças genéticas hereditárias nas populações ao redor do mundo, podemos encontrar números bem diferentes. A doença de Tay-Sachs, por exemplo, é cerca de 100 vezes mais frequente em judeus Ashkenazim do que na população em geral, na qual é considerada rara. 

Essas diferenças marcantes fizeram até com que algumas doenças fossem popularmente conhecidas por sua “geografia”, como a talassemia, que é conhecida também como anemia do mediterrâneo, já que foi primeiramente descrita e é mais comum em populações que vivem próximas ao Mar Mediterrâneo.

Mas o que faz com que uma doença genética hereditária seja mais comum em um grupo populacional específico? Descubra a resposta a seguir.

Doenças genéticas que são mais comuns em certas populações

A explicação para algumas doenças serem mais comuns em determinadas populações consiste no fato de que pessoas de um mesmo grupo étnico compartilham versões idênticas de alguns de seus genes, que foram passadas de geração em geração a partir de ancestrais comuns. 

Se essas versões de genes aumentam a predisposição para alguma doença, as pessoas dessa população serão mais acometidas por essa doença do que a população em geral.

Um grupo étnico é um grupo de pessoas que se identificam como pertencentes a um mesmo grupo, geralmente por compartilharem a mesma ancestralidade e outras características como história, cultura, religião, língua.

Esses genes que permaneceram podem ser mais frequentes em uma determinada população por causa do efeito-fundador e da consanguinidade.

Efeito-fundador e consanguinidade

Ao longo de nossa existência, em diferentes ocasiões, pessoas deixaram suas comunidades e migraram para formar uma nova população, seja por escolha própria ou por alguma questão histórica que as forçou. 

O efeito-fundador ocorre quando uma população cresce a partir de um pequeno número de pessoas, e todas as gerações subsequentes também se originam desses mesmos indivíduos fundadores e seus descendentes. Nesses casos é muito comum a união entre pessoas aparentadas (consanguinidade), devido a questões históricas, geográficas ou até mesmo culturais.

Quando isso acontece, as gerações não têm “mistura” de DNA com pessoas de outras populações, então, se alguma mutação que causa doença está presente nos genes fundadores, ela se difunde mais e, as doenças, se tornam comuns.

efeito fundador e as mutacoes em uma populacao

Nos grupos em que há união de pessoas não-aparentadas, ou seja, geneticamente distantes, os genes que causam mutações se tornam menos comuns na população.

Existe um campo da biologia chamado de Genética de Populações que estuda, entre outras coisas, a composição genética das populações, bem como as mudanças nessas composições que ocorrem ao longo do tempo.

Em outras situações, uma mutação se torna vantajosa e, por causa da seleção natural, ela é mantida nas pessoas de uma população. Por exemplo, os bajaus que possuem a capacidade de mergulhar profundamente por um longo período graças a uma mutação genética. 

Outro exemplo de mutação que pode se tornar vantajosa é a resistência conferida indiretamente, pelo resultado das mutações, a algumas doenças infecciosas. 

Veja alguns exemplos de doenças que acometem mais alguns grupos populacionais específicos.

Tay-Sachs nos judeus Ashkenazi

Historicamente, os judeus se separaram e se isolaram algumas vezes em grupos menores por causa de diferentes acontecimentos, como o Holocausto. Isso possivelmente fez com que pequenas populações tivessem a frequência de mutações relacionadas a certas doenças aumentada.

Uma dessas doenças é a Tay-Sachs, mais frequente em judeus Ashkenazi. Os Ashkenazi são judeus da Europa (principalmente do Leste Europeu) cujos grupos permaneceram por grande parte do tempo isolados e, com isso, os casamentos entre indivíduos aparentados eram comuns, o que possivelmente aumentou a frequência da variante genética que causa a doença Tay-Sachs.

A doença de Tay-Sachs é causada por uma mutação que impede o funcionamento correto de uma enzima, causando danos ao tecido nervoso e resultando em problemas neurológicos. Nos judeus Ashkenazi, estima-se que 1 a cada 3500 recém-nascidos tenha a doença e 1 a cada 29 pessoas sejam portadoras da mutação.

Anemia falciforme em populações africanas

A anemia falciforme é uma doença genética causada por uma mutação que provoca uma mudança na forma das hemácias, células vermelhas do sangue que carregam o oxigênio. As hemácias de pessoas com anemia falciforme ficam no formato de uma foice, daí o nome falciforme.

A anemia falciforme é frequente em populações africanas e em pessoas com ascendência africana, como muitos de nós, brasileiros, que têm como ancestrais as pessoas escravizadas trazidas da África ao Brasil. Estima-se que a anemia falciforme esteja em 1 a cada 12 pessoas na África.

A alta frequência da anemia falciforme nessas populações da África pode estar relacionada a uma proteção contra a malária conferida pelas mutações que causam a anemia falciforme. Assim, essas mutações podem ter se mantido na população por trazerem uma vantagem adaptativa.

A malária é uma doença transmitida por um mosquito e causada por um protozoário, que infecta as hemácias. O formato alterado das hemácias falciformes cria uma dificuldade para o protozoário invadir a célula sanguínea. A malária é uma doença endêmica em várias regiões do continente africano.

Polineuropatia amiloidótica familiar na população portuguesa

A Polineuropatia amiloidótica familiar (PAF), também conhecida como paramiloidose ou doença dos Pezinhos é uma doença genética que leva à produção e acúmulo de fibras rígidas em algumas partes específicas do corpo, como nos nervos, no trato gastrointestinal, no coração, nos olhos, entre outros órgãos.

A PAF é mais comum em portugueses e em pessoas com ascendência portuguesa principalmente das áreas do norte de Portugal, de onde os casos foram primeiramente descritos no início da década de 50. Estima-se que existam cerca de 20 pessoas afetadas pela doença a cada 100 mil habitantes em Portugal. Em brasileiros com origem portuguesa a PAF também pode ser frequente.

Estudos indicam que a mutação relacionada à PAF pode ter surgido a muitos séculos atrás em Portugal, na região norte, e ali se concentrou na população, principalmente por causa de uniões entre aparentados. Depois, a variante do gene com a mutação teria se espalhado para outras regiões devido ao comércio e às navegações, que levaram portugueses a outras partes do mundo, embora a maior frequência ainda seja em Portugal.

Talassemia em populações mediterrâneas

A talassemia é uma doença genética que causa alteração e diminuição na produção das hemácias, levando a pessoa a desenvolver um quadro crônico de anemia. 

A talassemia é também conhecida como anemia do mediterrâneo e é mais frequente em pessoas com ascendência de populações que habitam as regiões banhadas pelo Mar Mediterrâneo, como Itália e Grécia. No entanto, ela não é exclusiva dessas regiões, podendo também estar presente em pessoas do Oriente Médio e de algumas regiões da África e da Ásia. 

Com as ondas migratórias, a talassemia se espalhou para outras regiões do mundo. Na Europa como um todo, estima-se que afete 1 a cada 10 mil pessoas. No Brasil também afeta muitas pessoas, já que para cá vieram muitos imigrantes italianos, principalmente após a abolição da escravidão.

A distribuição da talassemia também sobrepõem-se às regiões onde a malária acontece com mais frequência, assim, especula-se que a talassemia confere um certo grau de proteção à malária, o que faz com que a mutação se mantenha presente ainda na população.

Todas essas doenças genéticas podem estar presentes em qualquer pessoa, independentemente de onde ela nasceu e de onde vieram seus antepassados. Mas como vimos, as variações genéticas, a geografia e até a história podem fazer com que uma doença seja mais comum de ser encontrada em uma determinada população. 

Agora que você já sabe sobre a genética de algumas populações, que tal se aprofundar mais sobre a sua?

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Por que algumas doenças são mais comuns em certas populações?

Pessoas de um mesmo grupo compartilham versões idênticas de alguns de seus genes, que foram passadas de geração em geração a partir de ancestrais comuns. Se essas versões de genes aumentam a predisposição para alguma doença, as pessoas dessa população serão mais acometidas do que a população em geral.

O que é efeito-fundador?

O efeito-fundador ocorre quando uma população cresce a partir de um pequeno número de pessoas, e todas as gerações subsequentes também se originam desses mesmos indivíduos fundadores e seus descendentes.

O que é consanguinidade?

É a união entre pessoas aparentadas, geralmente devido a questões históricas, geográficas ou até mesmo culturais. Pode aumentar o número de pessoas acometidas por uma doença genética.

4 comments
      1. Obrigada por responder, Nathália! Inclusive graças ao MeuDna pude saber que tenho a tal mutação e por causa disso fiz a cirurgia que vai me ajudar bastante. O serviço de vocês é essencial para a prevenção e acompanhamento de doenças genéticas. Gostaria que mais pessoas tivessem acesso a esse serviço.

      2. Oi, Carol!
        Agradecemos o seu comentário no blog e por ter compartilhado sua história conosco, que reforça ainda mais a importância da nossa missão: que as pessoas tenham conhecimento a respeito de suas próprias informações genéticas e que, com isso, possam tomar as melhores decisões para a saúde.
        Vamos continuar trabalhando para que mais pessoas tenham acesso aos nossos testes, possam se conhecer melhor e planejem um futuro com mais saúde!

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